"São quatro jogadores" - A troça harmônica
"São quatro jogadores. Nesta mesa. Frente a frente para jogar. São quatro cabras de peia. No desafio do jogo da bruxa. Em noite de lua cheia." ('Kukukaya' - Cátia de França)
A gente fica pensando em música que é pra ouvir e música que é pra ver. Será que isso existe? Será que não tem música que é pra ver e ouvir? Ou será, ainda, que, enquanto eu ouço, vejo? Eu ouçovejo. Serão ações simultâneas ou a mesma ação? Será música, imagem? Músicaimagem.
Enquanto tudo isso se desdobra/se questiona na nossa frente de uma maneira tão delicada, a música d'Troça vai se desenrolando em clima de acontecimento e registra, em um lugar especial, a beleza da Paraíba em suas composições e criações.
O quarteto composto pela poesia dos Limeira - Regina, Gustavo e Chico - conta, ainda, com a presença do cantor e compositor Lucas Dourado, que recentemente lançou "Motor Misterioso". Um trabalho com muita beleza, diga-se de passagem.
Hoje (ou seria ontem) tive a oportunidade de "verouvir" a Harmônica tocar. E digo: depois de tanto tempo indo e voltando de um canto para outro, sem pertencer a lugar nenhum, ter a chance de escutar "Kukukaya", de Cátia de França, paraibana, pela voz d'Troça, traz energia para o sangue e realegra o espírito. Dá vontande de recomeçar, de rever, de reanalisar. Dá vontade de pensar a arte que se quer e a arte que é possível. Dá pra desaparecer e emergir em outro lugar. Dá pra viver numa aquarela. Dá pra vestir uma cor. Dá pra mudar.
Acho que a resposta deve estar por esse caminho: aquarela, cor, textura, desenho... tudo construindo uma grande imagem que se desloca para além do que a gente não vê. A imagem vai rodopiando, sem forma definida, desenvolvendo uma dança frenética e viva. Uma dança acesa. Uma música acesa.
Dançaimagem. Músicaimagem.
As duas se enroscam e vão, no meio da profusão de colores, da multidão enlouquecida - balançada pela troça junto ao suor e ao som - construir alegrias. Elas vão abrindo espaço como um "alento... como um caminho no meio da dor".
Acho que "verouvir" a Troça me fez lembrar da Paraíba, da arte que me escolheu aqui. De ser para o que se nasce. De crescer e ser crescido. De não querer e não negar. De querer e vencer.
Uma músicaimagem que desdobra e redobra a gente em paleta deveria tocar nas esquinas das nossas ruas frias até que tudo virasse, de uma vez por todas, poesia.
*As fotos são do talentoso Rafael Passos.