Spotlight e o jornalismo investigativo
O jornalismo está em crise. Essa foi a primeira frase que ouvi dos professores da faculdade quando comecei o curso. O modelo tradicional da imprensa vem bambeando - principalmente se pensarmos no jornalismo impresso*.
Nesse contexto, reportagens investigativas - como a retratada em Spotlight - Segredos Revelados - são raras. Faltam espaço, quase sempre tomado por enormes propagandas, e tempo. As redações prezam pelo "ao vivo", pelo imediatismo mais do que tudo em tempos em que qualquer pessoa pode fazer um registro e jogar nas redes sociais. Assim, muitos erros também acontecem: matérias compartilhadas sem apuração, boatos etc, etc.
Em Spotlight - indicado na categoria de melhor filme no Oscar -, conhecemos a reportagem publicada pelo Boston Globe no início dos anos 2000 sobre cerca de 70 padres (inicialmente) acusados de pedofilia e que foram acobertados pela Igreja Católica e por seus advogados. A reportagem recebeu o Prêmio Pulitzer na época em que foi publicada. “O grande poder da imprensa, algo que eu, como um 'civil', não seria capaz de fazer, é questionar as pessoas sobre como elas foram abusadas, como aconteceu... Se é importante, tem que ser dito", afirma o diretor do longa Thomas McCarthy, em entrevista.
O filme ganhou o SAG Awards de melhor elenco no último dia 30.
A Ponte Jornalismo, fundada com apoio institucional da Agência Pública, tem como três principais segmentos segurança pública, justiça e direitos humanos. Os jornalistas que colaboram com o projeto formam um coletivo, também livre de interesses econômicos e políticos que acabariam por prendê-los a determinada abordagem. Duas reportagens recentes produzidas pela Ponte chamam a atenção: "Após três anos, chacina do Jardim Rosana vira símbolo da impunidade da PM de SP" e "As veias abertas da Faculdade de Medicina da USP".
Ilustração: Vitor Flynn/Revista Adusp
Essas iniciativas (e várias outras não citadas, como o Jornalistas Livres) não buscam somente o aprofundamento e a produção de reportagens de cunho investigativo, mas também uma nova forma de financiar o fazer jornalístico. Assim, o jornalismo se transforma e se adapta aos novos anseios e demandas do público que pede por caminhos, rostos e vozes diferentes.
* Vale a leitura de "A crise do jornalismo investigativo nos EUA".