Visões na Coleção Ludwig: um panorama do século XX
As narrativas artísticas que nasceram no pós guerra vieram de encontro às transformações culturais nas esferas mais variadas. Características como a fragmentação do sujeito e das identidades, a luta pela emancipação do pensamento frente ao que estava na hegemonia simbólica, causaram impacto direto nas relações humanas e no desenvolvimento da arte enquanto meio de comunicação das ideias e dos sentimentos.
Dentro dessa linha se destacou Robert Rauschenberg (1925-2008), que não via fronteiras entre a vida e a arte. Para ele, são fenômenos interdependentes, e não é possível pensar a vida descolada das reflexões artísticas, e vice-versa. A partir do momento onde o homem é um ser que nasce da interação e da troca de experiências, a arte deve ser encarada como uma consequência dos desdobramentos do cotidiano do artista: onde ele vive, com quem dialoga, quais referências buscou para si, seu modo de agir, de pensar, são esses fatores, entre outros, que influenciam a obra do artista e seu encaixe tanto no tempo como no espaço.
Outro artista importante dessa época foi Andy Warhol (1928-1987), que buscou retratar em algumas de suas obras o consumismo desenfreado e o ritmo de vida acelerado que levava a sociedade norteamericana. A relação entre as mudanças e as permanências da modernidade estão em contato com o que o pensador alemão Georg Simmel escreveu em seu ensaio "A metrópole e a vida mental" (1920), onde a vida nas grandes cidades é vista como algo extremamente hostil aos habitantes. Instigado a reagir aos estímulos “naturais”, ou melhor, naturalizados – como a pobreza extrema, violência, preconceitos -, o cidadão médio se vê numa condição de prisão a céu aberto, num enxame de cartazes publicitários que ditam o “way of life”, best-sellers sobre o caminho da felicidade e outras demandas que são impostas pelo capitalismo financeiro, sem espaço para se libertar e agir conforme sua necessidade e vontade, coagido pelo constrangimento e pelos padrões.
Georg Baselitz (1938) é mais um pintor que se destaca em Visões na Coleção Ludwig. Semelhante a Rauschenberg, Baselitz não fazia distinção entre o que era produzido em suas telas e suas experiências enquanto pessoa. Os sentimentos para ele eram a matéria-prima de suas obras, como nas telas Garrafa e Águia. Sua forma de se comunicar artisticamente buscava uma percepção sensorial não só pelas imagens justapostas, mas também pela inversão dos significados e pela valorização (expressa na obra) da raiva e da violência, base de seus trabalhos dado seu passado dramático e cheio de traumas.
A importância da Coleção Ludwig para o Rio de Janeiro, sobretudo para os jovens universitários que lidam com pensamento social/artístico – não farei separação de ambos aqui -, é a contribuição construída à margem da visão tradicional e hegemônica que domina o campo simbólico da arte, e como percebemos isso nas nossas reflexões teóricas e intervenções práticas. As relações de poder que influenciam as preferências estéticas, sexuais, valorativas, políticas e ideológicas, estão em confronto a todo momento, umas buscando se sobrepor às demais, outras querendo emancipar-se da esfera dominante. Saber lidar com as diferentes realidades que compõem o mundo contemporâneo é um desafio para a humanidade e suas demais ramificações, seja no cotidiano ou no meio acadêmico, seja artista, estudante, profissional ou apenas um amante do complexo universo da arte.