O inesgotável piquenique de Monica Gallab
A estratégia não é nada nova. Artifício de Sherazade contra o rei Shariar, punição sofrida por Sísifo de Ovídeo, por Prometeu de Ésquilo e também pelo personagem de Bill Murray no Feitiço do Tempo - todas histórias difíceis de esquecer.
O curta Nice Day for a Picnic, ou 'Um Bom Dia para um Piquenique' de Monica Gallab caminha na interseção entre uma vinheta da MTV e experimentos Dada. O mesmo desprendimento narrativo, a vontade de explorar impressões em vez de conclusões.
Pouca cor, poucos traços e poucas palavras: elementos mínimos que ocupam a mesma cena, mas não conversam entre si. Só habitam o mesmo espaço e repetem uns aos outros em uma estética de traços finos e imprecisos que lembra os desencontros de Paranoid Android, do Radiohead nas mãos do sueco Magnus Carlsson.
Crianças silenciosas, homens domesticados, a gigantesca, fria e única mulher, cada um repetindo sua coreografia cotidiana ao som mecânico e metálico da trilha incidental da também belga Deborah Dourneau.
Uma engrenagem que movimentada por uma criança, onde o homem se alimenta do próprio homem. Gallag se vale da não-verbalidade para criar cenas memoráveis e ricas em significados. Aos poucos, ação e edição se aceleram e as histórias paralelas parecem convergir a um fim, uma provável catástrofe.
Mas, no meio de tudo isso, um elemento atravessa seu caminho linear, sem repetições: as formigas que devoram o bolo do piquenique, como uma floresta que invade uma casa em ruínas depois que a rotina humana desiste de afastá-la.
Vitória da natureza sobre o homem? Do social sobre o individual? Interpretações válidas e, como uma boa obra simbólica, este piquenique está aberto a muitas outras. É por isso que fez bonito no Japão, na nativa Bélgica de Gallag, na Argentina, República Checa, entrou para o Staff Pick do Vimeo, recebeu menção honrosa no Gawker e passou pela seleção oficial do nosso Animamundi em 2009.
Vale a pena assistir de novo, e de novo, e de novo e de novo aqui.