Achados & Perdidos
Quando perdemos aquilo que nos é caro aprendemos a consentir em não ser tudo. Perder é também retirar e retirar-se. Retiramos expectativas, sonhos, planos, desejos. Retiramos presenças e olhares.
Viver é também a arte de retirar-se, é experimentar singularidades absolutas. É preciso querer e saber não ser tudo, aceitar a impermanência das coisas. Nem Deus aspirou ser tudo, contrário fosse só haveria Deus. Deus também se esgota em si, esvazia-se de sua onipotência, cede para que existam outras coisas. Deus permite sua ausência para que se torne presente. Na ausência sentimos a presença do silêncio e aprendemos a reconhecer o barulho. Até aquilo que permanece sobrevém mudando, e é também aí que mora o perder.
Perdemos invariavelmente e perder, por vezes, dói. Mas perder é a possibilidade de deixar vir. Perdemos a infância e ganhamos a juventude, perdemos amores e ganhamos lembranças; esquecemos lembranças e ganhamos o novo que também algum dia se tornará lembrança.
Só quem experimenta o perder pode também conhecer a possibilidade de ganhar; e por mais impossível que nos pareça, a cada perda encontramos um pouco mais de nós mesmos, porque há sentimentos que só podem ser medidos na impossibilidade de se cumprirem, e assim conhecemos um pouco mais de nós, daquilo que conseguimos ser e superar.
Perder pode ser extremamente doloroso, mas contém a chave para ganhos impensáveis; aprendemos o valor do tempo e a medida do silêncio. Quando perdemos aceitamos a recusa, visitamos as palavras não ditas, tocamos os gestos não tocados, conhecemos o convite negado.
Quando perdemos aprendemos que esperdícios gratuitos são perdas sem ganho. Quando perdemos ganhamos um eu desconhecido pronto para recomeçar.