Pare de sonhar, comece a viver
- Quando você vai clicar?
- Às vezes não clico. Se eu gosto de um momento. Quero dizer, se estou nele, pessoalmente, prefiro não ter a distração da câmera. Só o que quero é estar nele.
- Estar nele...
- É. Bem ali. Bem aqui.
(Trecho de A vida secreta de Walter Mitty)
Nada é mais tocante do que um momento bem vivido.
E um momento bem vivido, por sua vez, depende, e muito, do tamanho de seus sonhos.
O filme A vida secreta de Walter Mitty (do original The secret life of Walter Mitty), estrelado e dirigido por Ben Stiller, lançado em dezembro de 2013, é muito bem trabalhado sobre esse aspecto.
Baseado no conto do escritor americano James Thurber, publicado na revista The New Yorker em 1939, o filme conta a história de Walter Mitty (Ben Stiller), um sujeito com uma vida ordinária e até mesmo pacata, aparentemente satisfeito por seus 16 anos bem trabalhados como responsável pelos negativos das fotos que ilustram a revista Life, em fase de transição para mídia online.
Para compor a capa da última edição impressa, o fotógrafo Sean O’Connell (Sean Peann) manda para Mitty um pacote com alguns negativos junto de um presente e uma carta assinada onde o avisa ser o negativo de número 25 o escolhido para tal, por conter a imagem mais bela e magnífica. Acontece que ao checar os negativos, percebe a falta do número citado pelo fotógrafo e é aí que tudo acontece.
Por trás do jeitão simples está um homem sonhador, com uma imaginação que o coloca constantemente em outro cenário, deixando-o completamente “fora do ar” enquanto vivencia a experiência que vai criando em sua mente, onde ele sempre vê a si próprio como um herói glorioso.
Apaixonado por uma colega de trabalho (Kirsten Wiig), pressionado pelo chefe antipático (Adam Scott), invadido por um turbilhão de sentimentos e pela vontade de ganhar o mundo real, como em seus sonhos, Mitty sai em busca de O’Connell para saber onde está a imagem da última edição da revista e o que ele experimenta em seguida é simplesmente encantador.
O filme tem cor, movimento, e é nítido o cuidado até mesmo com a escolha das músicas que envolvem a história sutilmente. É daqueles filmes para assistir e guardar na memória porque é leve e faz pensar.
Nesse conjunto de pensamentos e reflexão fica o diálogo entre Mitty e O’Connell na introdução deste post.
Em plena era digital, onde qualquer coisa, a qualquer instante, pode ser retratada por meio de câmeras ultramodernas embutidas em dispositivos móveis cada vez mais conectados aos diversos canais de comunicação e redes sociais, no pequeno trecho sobre o “não-registro” fotográfico daquela que poderia ser a imagem de sua carreira, o despretensioso fotógrafo ensina, num gesto quase sem palavras, a importância de viver a realidade pelo momento que ela representa.
É verdadeiro e por isso, infinitamente repetido o ditado sobre o poder da imagem, que diz mais do que mil palavras. Mas, precisamente, o que vale lembrar: a amplitude do que se viu a olhos nus ou o que se tentou enquadrar na lente da máquina fotográfica?
Quanto vale a experiência de um momento?
"Viva enquanto viver!", sugeriu Nietzsche em seu aforismo. Foi assim com Mitty quando tomou o controle de sua vida, agindo no mundo real para embarcar numa jornada mais extraordinária que os seus próprios sonhos.
Nada contra o registro, em absoluto. Apenas a favor de se estar pleno em cada momento, sem a distração da câmera. Porque o que está na sua mente, está na sua mente e é esse o seu maior bem.
Imagens: Fox Sony Pictures HE Brasil