O Cinema Russo pelas lentes da política russa
Se a literatura russa é uma das melhores, o cinema russo é um dos mais antigos e importantes da história da sétima arte. Durante o regime czarista obras de Tolstói e Dostoiévski já eram adaptadas para as telas. Por ocasião da revolução russa e da instalação do novo regime, o cinema surge em um momento histórico em que o ideal do povo passou do cristianismo ortodoxo para a utopia comunista, que prometia como a religião, o reino da verdade e da justiça. Finalmente depois de séculos de imperialismo, uma vida feliz com igualdade e liberdade que seria experimentada ainda na Terra. Os ícones sagrados iam sendo substituídos pelos ícones do comunismo, e a revolução em sintonia com o desejo do povo se empenhou em destruir o Estado, mas ainda nem bem havia terminado e já se apressava em construir outro. Não tardou para que o reino comunista se tornasse ainda mais poderoso que o reino dos czares. Naquele momento o cinema russo sofria as influências do governo bolchevique que incentivava a produção de filmes que exaltassem a coragem e a valentia do povo. Mas seu cinema se tornaria célebre assim como a literatura, através de filmes e artistas diferentes e ideias distintas.
Em meados dos anos 1919 surge na Rússia um movimento artístico chamado Construtivismo dando ênfase no “sentido construído” através da arte, negando a chamada “arte de representações e abstrações”. Mas é no cinema que o Construtivismo ganha características próprias, e nessa fase se destacam entre outros, diretores como Serguei Eisenstein com filmes como O Encouraçado Potemkim de 1925 e Ivan o Terrível de 1944 e Dziga Vertov com O Homem da Câmera de 1929 e vários filmes de animação de curta metragem que faziam propaganda das fazendas coletivas e do Partido. Eisenstein, porém, apesar de produzir filmes que agradavam o regime, teve constantes atritos com Josef Stálin por causa de sua visão do comunismo e da sua defesa da liberdade de expressão artística. Em contraposição durante o período da Guerra Fria, os Estados Unidos produziam filmes para demonizar o comunismo, foi nessa época que surgiu o famoso agente espião 007. Os Estados Unidos, por sinal, tiveram oportunidade de conhecer e usar até hoje muito das técnicas cinematográficas de Eisenstein que trabalhou por um período em Hollywood.
Desde a Revolução Russa de 1917 até a extinção da União Soviética em 1991, foram 74 anos em que muitos intelectuais e diretores de cinema sofreram todo tipo de censura, que começaram a se abrandar a partir da década de 1980 no governo de Mikhail Gorbatchev. É deste período o chamado novo cinema russo com filmes como Penitência (1984), Garota Internacional (1989), um dos primeiros filmes a abordar o tema da prostituição na União Soviética, O Assassino do Czar (1991), que conta a verdadeira história do assassinato da família imperial russa e O Sol Enganador de Nikita Mikhalkov, ganhador do Oscar de melhor filme estrangeiro em 1995. É importante também citar Alexander Sokurov com filmes como Arca Russa de 2002 e Fausto de 2011, vencedor do Leão de Ouro em Veneza. Mas um dos diretores que merece destaque é Andrei Tarkovsky. Formado em pintura e música quando criança, Tarkovsky tinha um sentido apurado, produzindo filmes poéticos para falar da realidade.
Entre os novos diretores russos que surgiram na última década, estão algumas mulheres como Maria Saakian, uma cineasta de 34 anos que trouxe três filmes para a Mostra de Cinema Russo Contemporâneo da Caixa Cultural no Rio de Janeiro, evento que ocorreu em fevereiro deste ano: Farol de 2006, Essa não sou eu de 2012 e Entropia de 2012. Outro filme da Mostra que merece destaque é Leviatã, uma alusão à obra de Thomas Hobbes do diretor Andrey Zvyagintsev, ganhador do Melhor Roteiro no Festival de Cannes de 2014 e indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.
O crítico de cinema Andrei Plakhov que veio para a Mostra no Rio, mostrou-se preocupado com as tentativas recentes do governo russo de controlar o que se diz e se mostra nas produções que recebem incentivo público, até hoje alguns diretores são comissionados para fazer filmes de propaganda.
Não é uma novidade que até mesmo as artes podem ser usadas em benefício de ideologias políticas, algumas são criadas com esse objetivo, outras ganham nova interpretação para o mesmo fim. Hitler já fazia isso na Alemanha com a música e o cinema, e até com a filosofia. Não é fácil para os artistas driblarem governos autocráticos.
A Rússia é hoje, teoricamente, uma República presidencialista, mas parece que uma tradição autoritária a persegue agora na figura de Vladimir Putin, um ex-agente da KGB que governa o país de forma centralizadora há 16 anos, envolvido em suspeitas de corrupção, de liderar uma nova máfia russa, e com assassinato de opositores. Se depender do governo o cinema russo que se cuide.
Os melhores filmes de Tarkovsky: Nostalgia – 1983 - O Espelho – 1975 Solaris – 1972 Stalker – 1979 - O Sacrificio - 1986 - A Infância de Ivan - 1962 - Andrey Rublev - 1966
Melhors filmes russos de todos os tempos: http://melhoresfilmes.com.br/paises/russia
Fontes: http://corvobranco.tripod.com/ArtigosHT/ht_cinemarusso.htm http://cafecomwhisky.com.br/construtivismo-russo-e-o-cinema/ http://oglobo.globo.com/cultura/filmes/no-cinema-uma-nova-revolucao-russa-15222514