O desequilíbrio do abraço
Não estou habituada a esta intimidade que se transfigurou em diplomacia. É como se sua imagem nunca tivesse carimbado os meus olhos. Oi, como vai? Logo nós, que nos conhecíamos tão bem, agora, quase estranhos. E a família? Sinto-me sufocada. Desconforto por te conhecer demais. E no trabalho, tudo certo? Impossível retomar a espontaneidade. Não existe uma segunda chance. Esta semana começa a fazer frio.
Trivialidades que pesam exageradamente em cada frase. Tem visto o fulano? O verbo dói, o sujeito sofre. Não nos bastamos na mesma sala, onde a educação ganha proporções exageradas e artificiais. Você emagreceu. Seu cheiro, que tantas vezes impregnou em meu suor já parece uma lembrança remota. Está bem, nos falamos por aí.
Perdemos o equilíbrio do nosso abraço. Não sei mais a intensidade com a qual devo te abraçar. Ficamos em dúvida como a conversa deve terminar. Duelo em nosso adeus. Tchau, cuide-se. Você vira as costas e sai. Eu caminho no sentido contrário com um nó cego na garganta. Assim, sem nenhuma linha que nos prenda, sem que nenhum sentimento nos mantenha, sem que nossos olhos se despeçam. E seguimos. Como dois velhos estranhos.